Um novo produto criado para a prevenção da cárie, de baixo custo e com menos efeitos adversos que os similares no mercado, acaba de ter sua carta-patente expedida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Ceará, o invento é um verniz dentário produzido com óleo da copaíba, planta medicinal popular no Brasil, e tem potencial para ser um grande aliado para o cuidado dentário de crianças e de pacientes em tratamento ortodôntico.
Por meio da liberação de fármacos na boca, o verniz atua na diminuição de microrganismos envolvidos no processo de formação da cárie e desestruturam o chamado biofilme, que são as colônias de bactérias que vivem em processo de cooperação nos dentes e nas gengivas.
A fácil aplicação clínica dos vernizes, assim como sua alta capacidade de adesão na superfície dentária e da liberação lenta que realizam dos fármacos, faz com eles sejam bastante indicados para crianças de até 6 anos. Isso porque, até essa idade, elas têm maior dificuldade de cuspir, o que as leva, muitas vezes, a ingerir os produtos odontológicos.
“A cárie precoce na infância é uma condição patológica ainda muito prevalente na sociedade, principalmente em crianças em situação de vulnerabilidade social. Assim, esse produto farmacêutico poderia ser utilizado como estratégia complementar na saúde coletiva”, analisa Edilson Martins, professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos (PPGDITM/UFC) e um dos autores do invento.
Desde a década de 1960, informa o pesquisador, a indústria farmacêutica oferta no mercado o verniz de flúor, que possui ótimas propriedades de prevenção da cárie, atuando na reconstituição dos minerais que, por algum motivo, foram perdidos nos dentes e no fortalecimento do esmalte dentário. A nova alternativa, por meio do óleo de copaíba, opera em via distinta do flúor, agindo contra a proliferação excessiva de bactérias nocivas na boca, denominada disbiose oral.
Ambos os produtos previnem a cárie, mas as vantagens do verniz desenvolvido na UFC estão no fato de ser um produto natural nacional, representar menor risco de toxicidade e, além disso, ter menor custo de fabricação. “Durante os estudos, o verniz de copaíba se mostrou bastante seguro. O único efeito adverso relatado foi a questão do gosto forte da copaíba, mas que desapareceu após alguns segundos da aplicação”, relata o pesquisador.
O professor, que é farmacêutico e cirurgião-dentista, informa que o uso inadequado do verniz de flúor pode causar o que é chamado na odontologia de fluorose. A condição clínica, que se refere às pequenas manchas brancas ou amarronzadas que surgem na fase de formação dos dentes, podem representar tanto um problema estético quanto uma má-formação, com enfraquecimento do esmalte dentário. Esse risco, entretanto, não existe com o verniz de copaíba, pois o produto não leva, em sua composição, o ativo responsável por esse efeito adverso.
O Prof. Edilson Martins acrescenta que, além da cárie, o produto pode contribuir para a prevenção de outras condições que se originam da inflamação ou da proliferação excessiva de bactérias nocivas na cavidade oral. Outro público que pode ser bastante beneficiado com o verniz de copaíba são os pacientes em tratamento ortodôntico. Isso porque eles naturalmente tendem a acumular mais biofilme na cavidade oral, por conta do aparelho ortodôntico.
POR QUE A COPAÍBA
Pesquisas na área de odontologia com produtos naturais vêm aumentando nos últimos anos, na busca por novas substâncias que apresentem maior atividade farmacológica, com menor toxicidade, maior biocompatibilidade e valor mais acessível à população. Os estudos com copaíba, que é uma árvore nativa do Brasil, surgiram nesse movimento.
O gênero da copaíba (chamado cientificamente de Copaifera) compreende cerca de 72 espécies, das quais mais de 20 existem no Brasil, distribuídas nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Norte. O invento utilizou-se da espécie Copaifera langsdorfii, extraindo dela o óleo essencial, obtido no Mato Grosso do Sul.
“O óleo resina da copaíba é muito utilizado pelas comunidades rurais por suas ações cicatrizantes, anti-inflamatórias e antimicrobianas”, informa o Prof. Edilson Martins. Portanto, os pesquisadores seguiram uma normativa da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) que autoriza a produção de medicamentos fitoterápicos que já possuem uso consagrado popularmente (Resolução de Diretoria Colegiada-RDC nº 14, de 31 de março de 2010).
“Dessa forma, buscou-se na literatura a sua atividade ante microrganismos orais que participavam do processo de cariogênese [formação de cáries]. Daí, deu-se o processo para veicular esse ativo numa fórmula farmacêutica de liberação prolongada na cavidade oral”, explica o professor.
COMERCIALIZAÇÃO
O verniz de copaíba é um produto finalizado e pronto para a comercialização, afirmam os pesquisadores. Já foram realizados estudos preliminares sobre o custo final do novo produto, e foi concluído que este pode ser inferior a vernizes comerciais presentes no mercado. O Prof. Edilson Martins adianta que representantes da indústria farmacêutica já mostraram interesse na comercialização do invento, contatando pesquisadores durante a exposição de comunicações orais fora do País. Não há, contudo, nenhum contrato confirmado.
De acordo com ele, existe demanda por esse tipo de tecnologia. “Ele pode ser aplicado desde especialidades como odontopediatria, ortodontia e até em grandes programas de prevenção a cáries em pacientes de alto risco, como estratégia complementar em saúde coletiva”, esclarece.
Agora, com a concessão da carta-patente, esse processo pode ser facilitado. “A carta-patente ratifica ainda mais a possibilidade desse produto acabado ser introduzido na prática clínica, podendo gerar benefícios na saúde oral a um preço acessível, sendo também positivo como contrapartida para a população que direta e indiretamente financiou esses estudos por meio de sua carga tributária”, acredita o professor.
PESQUISAS
As pesquisas que culminaram no invento tiveram início em 2013 no Curso de Odontologia do Campus da UFC em Sobral, a partir de financiamento da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP) obtido pela Prof. Patrícia Lobo, através do programa Jovens Pesquisadores.
Em seguida, os estudos tiveram continuidade no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos (PPGDITM/UFC), em Fortaleza, durante o desenvolvimento da pesquisa de doutorado da Profª Lídia Audrey Rocha Valadas Marques, atualmente pesquisadora da Universidade de Buenos Aires (UBA), na Argentina. A investigação foi elaborada em parceria com o Prof. Said Gonçalves, do Laboratório de Farmacotécnica do Departamento de Farmácia da UFC, sob a orientação da profa. Mary Anne Bandeira.
Além dos professores Patrícia Lobo, Edilson Martins, Lídia Audrey, Said Gonçalves e Mary Anne Bandeira, também assinam como autores do invento Heraldo Guedes Lobo Filho, Cristiane Sá Roriz Fonteles e José Glauco Lobo Filho.
Fonte: Prof. Edilson Martins, do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos (PPGDITM/UFC) – e-mail: edilsonmrneto@hotmail.com
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