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Gengibre ajuda no combate à infecção generalizada

Pesquisadores descobriram que os gingeróis auxiliam na proteção das funções renais e melhoram o prognóstico de pacientes com sepse

Para melhorar o prognóstico de pacientes que chegam aos hospitais em condição de sepse polimicrobiana (infecção generalizada), pesquisadores da Universidade Federal do Ceará têm buscado tratamentos alternativos a partir de componentes do gengibre, capazes de combater disfunções renais e metabólicas associadas à sepse. A pesquisa, feita no Laboratório de Toxinologia Molecular, foi publicada no periódico Scientific Reports, da Nature.

Os componentes isolados e estudados são os gingeróis, responsáveis pelas características de pungência e ardor que sentimos ao comer o gengibre. Segundo as pesquisas realizadas, essas substâncias, amplamente presentes na culinária e na medicina alternativa oriental, melhoram o funcionamento do rim e podem resultar em um quadro geral positivo para o organismo dos pacientes.

Inicialmente, testes realizados em condições ex vivo, com rins saudáveis de ratos, revelaram dois fatores importantes a partir da administração dos gingeróis nos animais: o primeiro foi a poliúria, aumento da formação de urina pelo rim e maior fluxo urinário; o outro foi a natriurese, aumento da excreção de sódio junto com a urina.

Nas disfunções renais, alguns dos principais sintomas são justamente a diminuição na produção de urina e o desequilíbrio na excreção do sódio. Como os gingeróis afetaram diretamente essas características, os pesquisadores decidiram iniciar os testes com rins disfuncionais e também obtiveram resultados de melhora renal, atribuídos a benefícios anti-inflamatórios e antioxidantes no órgão causados pelos gingeróis.

Esses são fatores importantes para o combate à sepse, que pode ter como uma das consequências justamente a disfunção dos rins, caracterizada por queda nas reservas antioxidantes e participação significativa de agentes inflamatórios, problema que piora consideravelmente o prognóstico dos pacientes e, em geral, leva à morte. “O trabalho é para evitar isso e prevenir o impacto negativo de quando a lesão renal surge junto com a sepse”, explica o Prof. Alexandre Havt, orientador da pesquisa.

O Prof. Alexandre Havt (esquerda) é o orientador da pesquisa feita pelo pós-doutorando Adelvane Rodrigues (Foto: Ribamar Neto/UFC)

O Prof. Alexandre Havt (esquerda) é o orientador da pesquisa feita pelo pós-doutorando Adelvane Rodrigues (Foto: Ribamar Neto/UFC)

Justamente por conta da alta mortalidade de pacientes cuja infecção chega a esse estágio, mecanismos que possam proteger o sistema renal são de grande importância. “Quando a sepse evolui, ocorre o estágio de falha de múltiplos órgãos, e um dos principais atingidos é o rim. Esse é um quadro clínico geralmente difícil, que o médico tenta evitar”, diz Adelvane Rodrigues, autor do estudo de doutorado com os gingeróis.

Além disso, o paciente com sepse precisa de fármacos antibióticos para combater a infecção, remédios que podem aumentar as chances de falhas renais. Esse é outro motivo para que o tratamento tradicional seja acompanhado de alternativas que possam criar equilíbrio no organismo. Auxiliando na recuperação da normalidade do rim e reduzindo inflamações e estresse oxidativo, os gingeróis podem evitar um patamar mais grave.

FUNÇÃO RENAL

Responsáveis por filtrar o sangue, excretar substâncias tóxicas e eliminar produtos oriundos do uso de fármacos que podem ser nocivos, os rins têm papel essencial no correto funcionamento do organismo. Até que o paciente tenha uma disfunção renal crônica, há um quadro evolutivo.

“Após o dano agressivo, que pode ser um processo infeccioso, leva um tempo para que a doença alcance um patamar em que a pessoa necessite de hemodiálise [tratamento para problemas renais crônicos]. A proposta é que, desde o começo da doença, possamos ter medidas de intervenção para evitar a evolução de quadro pior e irreversível”, argumenta Adelvane.

Apesar de o foco da pesquisa estar no funcionamento renal, foi percebida, com isso, uma melhora metabólica geral, resultando em um aumento de sobrevida dos animais com sepse

O Prof. Alexandre Havt ressalta que o rim, assim como o fígado, tem boa capacidade de regeneração, podendo se recuperar de processos prejudiciais a seu funcionamento. Em um nível de disfunção muito elevado, porém, essa recuperação não ocorre. É o que acontece no caso de sepse, quando há uma lesão renal aguda provocada não só pela infecção, mas também pelo uso de fármacos antimicrobianos e anti-inflamatórios, indispensáveis ao tratamento e muitas vezes lesivos ao próprio órgão.

“O paciente precisa tomar o antibiótico. Se começarmos a prevenir [os efeitos negativos desse medicamento] com a administração do gingerol e depois mantivermos esse procedimento, damos um suporte para que o paciente tolere o processo inteiro. É algo para ser administrado conjuntamente com o tratamento”, diz o professor, explicando ainda que os gingeróis não afetam o funcionamento dos fármacos. “Já há trabalhos mostrando que, na verdade, eles podem ainda ser antimicrobianos. É outra hipótese a ser testada.”

BIOMARCADORES

A sepse também está associada a uma disfunção generalizada no organismo, com alterações gerais no metabolismo, incluindo hiperglicemia (excesso de glicose no sangue) e catabolismo (consumo de matéria orgânica pelo corpo para produzir energia). Os pesquisadores investigaram essas alterações em amostras de urina por meio de ressonância magnética nuclear.

Feita em parceria com o Prof. Edilberto Silveira, do Departamento de Química Orgânica e Inorgânica da UFC, a investigação teve o objetivo de identificar biomarcadores na urina dos animais que pudessem traduzir as condições do organismo e sua possível disfunção. Isso no contexto de uma ciência metabolômica, que considera as alterações do sistema chamado metaboloma.

Esse sistema é formado por metabólitos, produtos do processo de metabolização de moléculas do organismo, justamente os compostos que a ressonância buscava identificar. Exemplos de metabólitos são a creatinina, produto final do metabolismo da creatina muscular, continuamente liberada para o sangue e normalmente excretada pela urina, e o piruvato, gerado após a absorção celular da glicose.

O diagrama mostra o efeito dos gingeróis nos animais. No primeiro modelo de sepse, sem aplicação de gingerol, há diminuição da sobrevida. No segundo modelo, com aplicação dos gingeróis, há aumento de sobrevida (Imagem: Divulgação)

O diagrama mostra o efeito dos gingeróis nos animais. No primeiro modelo de sepse, sem aplicação de gingerol, há diminuição da sobrevida. No segundo modelo, com aplicação dos gingeróis, há aumento de sobrevida (Imagem: Divulgação)

Se há problema renal e modificação dos sistemas orgânicos, uma investigação metabolômica mostra uma quantidade anormal desses metabólitos no soro sanguíneo e na urina, proporcionando a identificação e um estudo amplo da disfunção.

“O que havia na urina nós identificamos com a ressonância magnética nuclear. No animal-controle, encontramos determinados metabólitos, mas o animal com sepse já apresentava outros, diferentes também do animal tratado somente com o gingerol”, explica o Prof. Alexandre Havt.

Após a administração do gingerol, foram encontrados metabólitos com fatores anti-inflamatórios produzidos em maior número, tanto em animais saudáveis quanto em situação de sepse. “Nos animais que somente receberam o gingerol, a produção desses componentes já aumentava. Quando o animal estava séptico, a produção era ainda maior”, diz o pesquisador.

Apesar de o foco da pesquisa estar no funcionamento renal, foi percebida, com isso, uma melhora metabólica geral, resultando em um aumento de sobrevida dos animais com sepse. Saber o impacto real dos gingeróis em outros órgãos, porém, dependerá de novos estudos. Além disso, os pesquisadores visam à aplicação das técnicas desenvolvidas em futuras pesquisas clínicas no Hospital Universitário Walter Cantídio da UFC.

SAIBA MAIS

Leia a pesquisa completa (em inglês), publicada no periódico Scientific Reports, da Nature

Fonte: Prof. Alexandre Havt, do Laboratório de Toxinologia Molecular – ahavt@ufc.br

Kevin Alencar 4 de dezembro de 2018

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