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Theatro José de Alencar é o primeiro do Brasil a ganhar modelo em 3D de alta precisão; projeto auxilia na manutenção e nos restauros do patrimônio

Projeto desenvolvido por alunos e professores da UFC é a representação mais precisa já elaborada para equipamentos históricos do Ceará. Digitalização já permite visitas virtuais ao teatro

Acompanhando um modelo que já vem sendo aplicado em diversas partes do mundo, o Theatro José de Alencar, considerado o equipamento histórico mais importante do Ceará, tornou-se o pioneiro do Estado e do País a ter seu patrimônio cultural digitalizado em alta precisão.

Através de técnicas de última geração, o teatro passou por um levantamento tridimensional de toda a sua estrutura, gerando uma moderna documentação que poderá ser usada para futuros projetos de manutenção e restauro, além de permitir que o edifício se torne objeto de visitação virtual.

O trabalho foi realizado por uma equipe multidisciplinar de professores e alunos do Curso de Engenharia Civil e do Curso de Ciência da Computação, ambos do Campus da Universidade Federal do Ceará em Russas, além de professores e alunos do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e Design, em Fortaleza.

Inserida no escopo do projeto Inovação e Tecnologia para o Patrimônio Cultural do Ceará, vinculado ao programa Cientista-Chefe de Cultura, do Governo do Estado, a ação contou com um investimento, em sua primeira etapa, de R$ 540 mil provenientes da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP).

O Theatro José de Alencar, com 3,8 mil metros quadrados de área construída, foi inaugurado em 1910. Em 1964, devido à sua grandiosidade, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Desde a inauguração, passou por diversas reformas, realizadas nos anos de 1918, 1938, 1956, 1974 e 1990/91.

A atualização da documentação do teatro foi realizada no projeto em três etapas principais. Inicialmente, foi feita a catalogação dos documentos históricos existentes, como fotos, representações gráficas e registros da história, do projeto e da construção do equipamento.

Modelos 3D do Theatro: a) uma nuvem de pontos 3D do scanner a laser; b) nuvem de pontos 3D da fotogrametria; c) modelo 3D BIM; e d) modelo BIM renderizado em 3D (Imagem: Reprodução)
Modelos 3D do Theatro: a) uma nuvem de pontos 3D do scanner a laser; b) nuvem de pontos 3D da fotogrametria; c) modelo 3D BIM; e d) modelo BIM renderizado em 3D (Imagem: Reprodução)
Modelos 3D do Theatro: a) uma nuvem de pontos 3D do scanner a laser; b) nuvem de pontos 3D da fotogrametria; c) modelo 3D BIM; e d) modelo BIM renderizado em 3D (Imagem: Reprodução)

O material, em 2-D, foi obtido nos arquivos do IPHAN-Ceará. Com esse material, foram investigados a história do teatro, os usos dos equipamentos ao longo do tempo, os estilos arquitetônicos, os planos, as fachadas, os adornos internos e externos, o histórico social e cultural do teatro, a construção e as intervenções patrimoniais, entre outros aspectos de importância para a compreensão da edificação.

Após essa etapa, foi realizado o levantamento digital, através de fotogrametria UAV (registros fotográficos feitos por drones) e técnicas de varredura, feitas por scanner. Com os drones, foram registradas 239 capturas, especialmente para os telhados, onde é mais complicado utilizar um laser scanner terrestre.

Em seguida, essas imagens foram usadas para sincronizar com os dados do escaneamento terrestre, de forma a diminuir as imperfeições do modelo a ser criado do teatro, o qual constituiu a terceira etapa do projeto.

Essa terceira etapa tratou-se de uma modelagem da informação da construção (building information modelling – BIM), que é um modelo em 3-D capaz de ser enriquecido por novas informações de acordo com o dinamismo do edifício histórico ao longo do tempo. Como se trata de um patrimônio, foi executado o modelo BIM para equipamentos históricos, chamado de HBIM, que envolve o registro digital do historicismo relatado pelas construções.

Sobre esse último processo, o Prof. Esequiel Mesquita, do Campus de Russas e responsável pelo projeto, explica: “É uma modelagem tridimensional em que nós conseguimos inserir informações diversas, não só geométricas, mas também das propriedades dos materiais, degradação, e conseguimos evoluir para o planejamento das intervenções de manutenções, dentre outras coisas”.

MODELO 3-D ATENDE À NOVA LEGISLAÇÃO

O professor acrescenta que a nova Lei de Licitações (Lei n° 14.133/2021) prevê que será preferencialmente adotado o modelo BIM nos novos contratos do governo, o que impacta diretamente a forma com a qual se documentam e registram as construções históricas, tornando necessária essa atualização.

Uma das razões para que a lei passasse a sugerir a adoção desse novo modelo é o fato de que documentos em 2-D, como plantas, croquis e desenhos, dificultam a integração com softwares e tecnologias utilizados hoje na gestão do patrimônio cultural.

O levantamento em 3-D garante um registro mais fidedigno ao que está atualmente construído, que passa a funcionar como referência para obras futuras. Outra característica do BIM é que ele inclui, ainda, o que se chama de atributos de semântica, ou seja, aspectos de identificação do objeto legíveis por máquina.

Esses elementos auxiliam, explica Mesquita, na classificação da informação e na melhoria significativa de sua gestão, por propiciar que determinado elemento da construção seja dividido de acordo com suas componentes do mundo real.

“Para exemplificar, vamos imaginar uma parede, que comumente se representa em 2-D como um único elemento. Quando transposto para o HBIM, detalhamos em blocos, argamassas, camada de reboco, pintura e outros pormenores, de modo que, quando precisarmos da informação sobre qual a quantidade de argamassas de revestimento e quais as propriedades de composição material dessa argamassa, o modelo me oferece essa informação de modo automatizado”, pontua o professor.

Todo esse processo de atualização da documentação do Theatro José de Alencar foi descrito no artigo ”Updating the documentation of a historic building: a case study of the José de Alencar Theatre” (“Atualização da documentação de um prédio histórico: um estudo de caso do Theatro José de Alencar”, em tradução livre), publicado na revista internacional Journal of Building Pathology and Rehabilitation.

O grupo de pesquisadores responsáveis pelo estudo (Foto: Arquivo pessoal)

REPRESENTAÇÃO MAIS PRECISA

O trabalho desenvolvido no Theatro José de Alencar é a representação mais precisa já elaborada para equipamentos históricos do Ceará. O modelo possui uma precisão de cerca de 2 milímetros, o que é considerado de extrema exatidão. Isso garante que as informações coletadas podem ser armazenadas para utilização em exposições, em estudos, em projetos e inclusive para avançar nas impressões 3-D.

“Imagina que algumas peças desses equipamentos se desgastam com o tempo e precisarão de reposição. E é extremamente difícil e complexa a reconstrução, parcial ou total, de um elemento perdido no tempo, pois, muitas vezes, essa referência geométrica e material é perdida. Com a guarda dessa informação, conseguimos, através dos registros coletados aqui, avançar para impressões 3-D, o que pode facilitar a manutenção e salvaguarda do patrimônio cultural”, destaca Mesquita.

O professor esclarece que o teatro já possuía alguns registros da construção do prédio, mas eram limitados e imprecisos, como, por exemplo, nos contornos e detalhes artísticos com profundidade. Nesse sentido, a digitalização recupera o traçado original de forma mais próxima da realidade.

O método, que já é usado em outros países, foi aplicado ao presente projeto tomando como referência a Itália, que tem digitalizado seu patrimônio cultural numa tentativa de atualizar esses registros para desenvolvimento de estudos, de projetos e de melhor qualificação dos bens culturais.

VISITA VIRTUAL E NOVOS EQUIPAMENTOS

Entre as razões que motivaram a elaboração do projeto Inovação e Tecnologia para o Patrimônio Cultural do Ceará” está, afirma o professor, o interesse em difundir e tornar acessível o patrimônio cultural do Estado a toda a população e, com isso, contribuir para sua valorização. Um dos ganhos do levantamento tridimensional foi permitir que fosse disponibilizado, por meio da Internet, um tour virtual pelo teatro. A visita já pode ser realizada por meio da Plataforma Documenta CE.

“Isso é interessante, pois traz contribuições para a educação, permitindo que as aulas de História do Ceará e outras disciplinas possuam um acervo virtual à sua disposição para visitação, além de dar mais acessibilidade e difusão ao nosso patrimônio cultural”, avalia o professor.

Além do teatro, a plataforma já inclui outros monumentos, como o Museu da Imagem e do Som, a Biblioteca Pública do Estado do Ceará (BECE), a Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho, a Escola de Gastronomia Ivens Dias Branco e o Sobrado Dr. José Lourenço, que são equipamentos que estão no escopo do programa Cientista-Chefe Cultura.

O Prof. Esequiel Mesquita informa que a expectativa é que, com a renovação do projeto, sejam digitalizados cerca de 20 equipamentos culturais do Ceará. “Nessa nova etapa do projeto (2023-2025), iremos avançar para o Interior do Estado, para Aracati, Icó e Viçosa; e adentrar também o patrimônio natural do Ceará, como a digitalização da Gruta de Ubajara”, adianta.

Fonte: Prof. Esequiel Mesquita, do Campus de Russas – e-mail: emesquita@ufc.br

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Sérgio de Sousa 30 de maio de 2023

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