Substância encontrada em uma árvore amazônica traz nova promessa contra a depressão. A riparina 3 é um alcaloide presente na Aniba riparia, conhecida por louro ou louro-rosa, que vem sendo investigado há alguns anos por pesquisadores do Laboratório de Neurofarmacologia, ligado à Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (FAMED/UFC), em parceria com grupos das Universidades Federais da Paraíba e do Piauí.
Os pesquisadores publicaram em 2021 o estudo pré-clínico “A riparina III é uma droga promissora no tratamento da depressão?” no European Journal of Pharmaceutical Sciences, no qual apontam o potencial da riparina como antidepressivo. Os estudos pré-clínicos são realizados com animais e constituem parte importante – ainda que inicial – de qualquer processo de desenvolvimento de medicamentos.
MODELOS DE COMPORTAMENTO
A primeira parte do estudo focou em modelos de comportamento usando animais. Nessa fase, camundongos são estimulados a adotar padrões de comportamento que simulem certas condições humanas.
No estudo, um grupo de cobaias recebeu a riparina via oral, diluída em água destilada, enquanto outro grupo recebeu apenas água destilada, servindo como controle. Ambos foram submetidos a situações de estresse, às quais respondiam com comportamento semelhante à depressão. Após uma série de testes e estímulos, o grupo que recebeu a riparina mostrou-se muito mais resistente à depressão induzida por estresse do que o grupo controle.
A segunda parte da pesquisa envolveu testes neuroquímicos. Nesse tipo de estudo, são analisadas áreas como hipocampo e córtex pré-frontal do animal, bem como o nível de substâncias associadas ao comportamento depressivo. Uma vez que isso ocorre, comparam-se os níveis dessas substâncias do grupo controle com aquele que recebeu a riparina 3.
A pesquisa analisou os níveis de neurotransmissores do sistema nervoso central (monoaminas), citocinas pró-inflamatórias, estresse oxidativo, níveis de cortisol, bem como de fatores neurotróficos. Todas essas substâncias estão, de alguma forma, associadas a um quadro depressivo, mesmo que a ciência ainda esteja buscando a melhor explicação para essas relações.
Comparando com o grupo controle, em todas elas, a riparina demonstrou excelentes resultados, gerando um efeito semelhante ao antidepressivo. “A gente fechou um ciclo, investigando todas essas situações. Por isso a pergunta do título do artigo. Na realidade, a riparina respondeu a muitas hipóteses que estão relacionadas à depressão”, diz a Profª Cléa Florenço, coordenadora da pesquisa.
PRIMEIRO PASSO
A doença, diz a pesquisadora, é um grande desafio para a medicina, daí a importância de se buscar novas drogas. “Ainda existe um percentual entre 30% e 40% de pacientes que não respondem bem aos antidepressivos que temos no mercado”, explica.
O número fala por si só, mas não é o único motivo para a procura por novas opções de tratamento. “Os antidepressivos que temos no mercado ainda têm uma resposta muito retardada. Geralmente, eles levam uma ou duas semanas, às vezes até um mês, para iniciar o efeito”, diz a Profª Cléa. Some-se a isso os efeitos colaterais da medicação, como sonolência e disfunção sexual, dentre outros.
O caminho para encontrar essas novas drogas, no entanto, é longo. Depois da pesquisa pré-clínica, é necessário analisar toxicidade, segurança e eficácia da droga. A seguir, inicia-se uma série de testes clínicos (realizados em humanos), o que pode levar anos. Somente depois disso, um medicamento é passível de ter o uso autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
Um aspecto positivo é que o Laboratório de Neurofarmacologia compõe o Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos (NPDM), estrutura da FAMED/UFC que reúne diversos grupos de pesquisa orientados justamente ao desenvolvimento de novas drogas. As conversas com os pesquisadores da área de farmacologia clínica, que podem apoiar as próximas fases do estudo, já foram iniciadas.
No caso da riparina, os pesquisadores do Laboratório de Neurofarmacologia já realizaram estudos e descartaram qualquer toxicidade. “Agora, nosso próximo passo é analisar segurança e eficácia”, sintetiza a Profª Cléa.
SAIBA MAIS
A pesquisa foi realizada com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP) e apoio do NPDM, do Programa de Pós-Graduação em Farmacologia (PPGF) e do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da UFC.
Participaram da equipe a pesquisadora Auriana Vasconcelos, cuja tese de doutorado teve a riparina como tema, além dos professores José Maria Barbosa (Universidade Federal da Paraíba) e Stanley Chavez Gutierrez (Universidade Federal do Piauí) e da Profª Danielle Macêdo (UFC).
Também compõem o grupo: Raquell Chaves, Victor Celso Cavalcanti, Alyne Carvalho, Íris Oliveira, Daniel Moreira e Tiago Valentim, do PPGF, e Natália Oliveira, da Rede Nordeste de Biotecnologia (RENORBIO).
Leia o artigo completo (em inglês) publicado no European Journal of Pharmaceutical Sciences.
Fonte: Profª Cléa Florenço – e-mail: clea@ufc.br
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