Desde que se iniciou no primeiro semestre de 2020, a pandemia de covid-19 trouxe muitas incertezas. Entre elas, esteve a dúvida sobre como as economias mundiais reagiriam ao crescimento exponencial da doença, que chegou a tirar a vida de mais de 6 milhões de pessoas em todo o globo e provocou mudanças na estrutura produtiva e econômica.
Avaliar o impacto do coronavírus nos mercados financeiros de alguns dos principais países do mundo, incluindo o Brasil, foi o objetivo de pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Economia, da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade (FEAAC) da Universidade Federal do Ceará.
O estudo, publicado em cinco diferentes artigos internacionais e depois reunidos em tese de doutorado intitulada Essays on the international financial markets impacts of covid-19, de autoria do pesquisador Antônio Cristiano de Oliveira Costa, com orientação do Prof. Paulo Matos e coorientação do Prof. Cristiano da Costa da Silva, considera para a análise, além do Brasil, os mercados da Alemanha, EUA, França, Canadá, Reino Unido, Itália, Japão e China. Dados de casos e mortes por covid-19 no Brasil, EUA, França, Reino Unido e Itália foram utilizados como variáveis explicativas.
No caso brasileiro, analisado em artigo específico, tomando como base o Ibovespa, principal indicador de desempenho do mercado financeiro do país, percebeu-se que tanto o aumento no número de casos de covid-19 quanto de mortes pela doença causou impacto imediato e de curto prazo nos retornos do índice. Constatou-se redução nos retornos principalmente no período de março de 2020, quando a pandemia começou a se agravar.
Levando em conta os dados de covid-19 dos países analisados e relacionando-os aos do Brasil, viu-se que o aumento no número de mortes nesses países provocou mais impacto na Ibovespa do que o aumento do número de casos. Os dados dos EUA, da China e da Itália foram os mais relevantes nesse aspecto, ou seja, quando esses países apresentavam aumento no número de mortes, o retorno do índice Ibovespa era afetado.
“[O motivo] por trás dos efeitos mais significativos estarem alinhados no tempo com os períodos mais agudos da pandemia no país pode se ligar ao fato de nesses períodos os agentes locais [do Brasil] estarem mais sensíveis às informações sobre a pandemia”, opina Antônio Cristiano de Oliveira Costa, autor dos artigos. “Assim, eles poderiam estar mais propensos a levar em conta informações sobre a situação da pandemia em suas decisões de compra e venda”, diz.
Exatamente por isso, os períodos em que mais se percebeu o impacto direto no retorno do Ibovespa foram os de janeiro a maio de 2020 e de março a julho de 2021, duas épocas em que a pandemia alcançou seus níveis mais alarmantes, não apenas no Brasil mas também nos outros países analisados, tanto em número de casos quanto de mortes.
PADRÃO E PREDIÇÃO
A análise relacional da situação do mercado financeiro brasileiro com outros países revela-se importante porque o Brasil segue o mesmo padrão observado internacionalmente: apresenta relações mais intensas entre a bolsa de valores e os números da covid-19 durante períodos em que o estágio da pandemia se mostrou mais avançado.
Em comum com os EUA, por exemplo, percebe-se no Brasil “a relevância de séries internacionais para a bolsa local, o fato das séries de covid-19 anteciparem bons dias de bolsa e da bolsa antecipar dias de melhora nas séries de covid-19, além da presença do contágio financeiro entre os setores da economia”, analisa Cristiano.
Além do artigo focado no caso do Brasil, a pesquisa também conta com análise da influência das séries de mortes nos EUA, na Itália e na França e de casos de covid-19 nesses países e no Reino Unido. Uma percepção que se destaca no estudo é a de que os números da doença puderam antecipar os dias mais positivos ou negativos na bolsa americana.
Outra avaliação, apontada por um terceiro artigo, foi a de que houve o chamado contágio financeiro nos mercados considerados pelo estudo, sobretudo no período agudo da crise causada pelo coronavírus, em fevereiro e março de 2020. O contágio pode ser entendido como o alastramento da crise para diversos mercados a partir de pequenos choques em determinadas regiões.
O contágio financeiro também foi pauta do quarto artigo, que investigou o comovimento entre os setores bancários (ou seja, a relação entre eles) dos países do G7, percebendo-se aumento de 20% nesse comovimento. Entre Alemanha e Itália, a taxa foi ainda maior, de 34%, sendo os números da covid-19 fator explicativo de um terço desse aumento.
Esse maior comovimento significa que movimentos observados em determinado mercado acabam sendo feitos “em conjunto” com outros, ou seja, na pandemia, se o mercado alemão seguia determinado caminho, havia maior chance de que o italiano repetisse esse caminho.
Por fim, em um último artigo, a pesquisa investiga como os efeitos de transbordamento de risco (algo como a possibilidade de uma modificação em um mercado gerar também modificações em outros) entre índices da economia dos EUA. “Observamos um aumento substancial nos efeitos de transbordamento de risco e que o setor de finanças foi central em enviar risco para os outros durante a pandemia”, aponta Cristiano.
A leitura de cada artigo pode ser feita na tese defendida pelo pesquisador, disponível (em inglês) no Repositório Institucional da UFC.
Fonte: Antônio Cristiano de Oliveira Costa, pesquisador do CAEN – e-mail: antoniocostabr@gmail.com / Prof. Paulo Matos, do CAEN – e-mail: paulomatos@caen.ufc.br
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