Em muitos litorais, é comum a aparição de manchas de coloração marrom, que costumam assustar banhistas e moradores, dado o desconhecimento sobre suas causas e efeitos. Para sanar essas dúvidas, pesquisadores do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará, estudaram o fenômeno na praia do Futuro, em Fortaleza, buscando entender sua relação com ondas, marés, vento e chuva.
“Muitas pessoas associam as manchas com a ocorrência de derramamento de óleo ou de poluição. Entretanto, as manchas marrons nessa praia são formadas pela presença de duas espécies de pequenas algas, chamadas diatomáceas”, explica a oceanógrafa Andrea Franco, formada pela UFC e atualmente aluna de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
As diatomáceas são organismos unicelulares que chegam a atingir 2 milímetros de tamanho e vivem junto à areia, no fundo do mar. “Até o momento não identificamos espécies tóxicas formando essas manchas”, complementa Andrea.
A pesquisa, feita em parceria com a FURG, mostrou que é durante o primeiro semestre do ano, no período chuvoso no Ceará, que há maior incidência de manchas. Com a chuva, mais nutrientes acabam sendo carregados até o mar, aumentando a quantidade desses micro-organismos.
Os fatores mais importantes, porém, são a maior intensidade das ondas e a força da maré, que promovem um movimento chamado swell: é como um revolvimento que puxa o que está no fundo, levando as diatomáceas para o topo. O tamanho das manchas, portanto, é diretamente influenciado por essas condições.
Dessa forma, somente a presença maior de nutrientes não é suficiente para que o fenômeno ocorra, como lembra o Prof. Marcelo Soares, um dos responsáveis pela pesquisa. “Em outras praias, como a Beira-Mar, as manchas não surgem, porque a água lá é parada”, justifica. “Se fosse apenas pelo nutriente, o fenômeno também aconteceria lá.”
Mesmo assustando banhistas, o fenômeno possui um impacto positivo na produtividade do ambiente marinho e da atividade pesqueira
Justamente por conta do papel da maré nesse processo, a pesquisa é uma novidade para estudos sobre o tema, que não haviam ainda se dedicado a litorais próximos à Linha do Equador. Em outros locais onde as manchas também surgem, como África do Sul, Austrália e sul do Brasil, nas praias do Rio Grande do Sul, a maré não tem a mesma força, surtindo pouca influência.
“Tenho estudado o fenômeno das manchas marrons na praia do Futuro desde a década de 1990 e é um fenômeno de interesse local e internacional pela forma como acontece. Ainda não temos dados para relacionar a ocorrência de manchas (aumento e acumulação das diatomáceas) com a de poluição, porém os resultados permitem entender em que época ocorrem mais e as razões naturais para isso”, explica outra autora do estudo, a pesquisadora Maria Odete Parente Moreira, do Labomar.
Mesmo assustando banhistas, que acabam preferindo evitar a água com manchas, o fenômeno possui um impacto positivo na produtividade do ambiente marinho e da atividade pesqueira. “Os pescadores gostam das manchas, porque as águas ficam carregadas de nutrientes e mais peixes visitam o local, além de o fenômeno ser algo importante para o turismo, por conta da curiosidade gerada”, diz Marcelo.
Os pesquisadores fizeram visitas à praia do Futuro durante um ano para avaliar os períodos de aumento e diminuição das manchas. Os resultados foram publicados em artigo na revista internacional Estuarine, Coastral and Shelf Science, disponível para leitura on-line.
Mesmo não estando ligada inicialmente ao despejo de substâncias como óleo ou petróleo, a ocorrência do fenômeno não pode ser utilizada como indicador de qualidade da água, que ainda pode estar imprópria para banho por outros fatores que não estejam relacionados à presença das manchas.
Fonte: Prof. Marcelo Soares, do Labomar – e-mail: bio_marcelo@yahoo.com.br