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Tecnologia criada na UFC auxilia estudantes com deficiência visual no estudo de Computação

Chamado de BlindDS, o dispositivo é composto por um material educacional tátil, produzido por impressão 3D, e está disponível para acesso livre e gratuito por pessoas e instituições de ensino

O número de pessoas com deficiência no Ensino Superior quase triplicou em 10 anos, segundo dados do mais recente Censo da Educação Superior divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). O estudo, que considerou as matrículas entre os anos de 2013 a 2023, destacou um aumento no acesso às graduações desse público. Todavia, os estudantes com deficiência ainda são menos de 1% daqueles que concluem um curso universitário no Brasil, sendo questões relacionadas à acessibilidade – de currículos, espaços, materiais e práticas pedagógicas – as maiores barreiras para a conquista do diploma. 

Fazendo frente a essa questão, uma pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Tecnologia Educacional (PPGTE), do Instituto UFC Virtual, resultou no desenvolvimento de um material educacional tátil e acessível para apoiar estudantes com deficiência visual. Chamado de BlindDS – do inglês, Blind (cego) e DS (sigla para Data Structure / estrutura de dados) –, o dispositivo é voltado para alunos com deficiência de cursos da área da computação, e está disponível para uso livre por pessoas e instituições de ensino superior. 

O produto foi elaborado pelo pesquisador e servidor técnico-administrativo da UFC Allan George Bezerra, egresso do curso de Computação e que possui deficiência visual. Partindo de suas próprias vivências, Allan utilizou o lema “Nada sobre nós, sem nós”, que preconiza a inclusão das pessoas com deficiência em diversas esferas, para a construção da ferramenta que utiliza a tecnologia de impressão em 3D. 

Imagem: foto do inventor do dispositivo manuseando-o sobre uma mesa
A ferramenta foi elaborada pelo pesquisador e servidor técnico-administrativo da UFC Allan George Bezerra, egresso do curso de Computação e que possui deficiência visual (Foto: Ribamar Neto/UFC)

“O que observo é que, em quase todas as pesquisas que levantei, a pessoa com deficiência [PCD] era somente a homologadora de uma solução. A melhor forma de ter uma solução bem desenvolvida para um problema que afeta às PCDs é que essas pessoas participem do processo, pois elas quem terão o maior poder de validação do que está sendo desenvolvido. As PCDs devem comandar, ou pelo menos participar, dos processos que objetivam a sua própria inclusão”, comenta Allan Bezerra. 

DISPOSITIVO 

Composto por um material educacional tátil produzido por impressão 3D, um guia de uso e duas sequências didáticas de apoio ao professor, o BlindDS tem por finalidade ser utilizado para a compreensão de conteúdos como “árvore binária” e “estruturas lineares”, que integram a disciplina “Estrutura de Dados”, comum a diversos cursos da área da Computação. Destaca Allan Bezerra que, apesar de serem atrativos aos estudantes PCD devido às tecnologias assistivas, os cursos no campo da  tecnologia da informação representam um desafio a esses alunos por abrangerem conteúdos focados em elementos visuais. O dispositivo criado no Laboratório de Computação Física da UFC (LCF/UFC Virtual), portanto, possibilita às PCDs a compreensão gráfica dos tópicos ensinados por meio do tato. 

Imagem: dispositivo sendo manuseado por duas mãos sobre uma mesa
O BlindDS tem por finalidade ser utilizado para a compreensão de conteúdos como “árvore binária” e “estruturas lineares”, comuns a diversos cursos da área da Computação (Foto: Ribamar Neto)

“Precisava desenvolver um material educacional tátil que permitisse que um discente com deficiência visual tivesse total autonomia para acompanhar a disciplina de Estrutura de Dados. Para isso, o aluno não poderia fazer tudo sozinho, afinal, o professor e seus colegas também fazem parte do processo de aprendizagem, dentro e fora da sala de aula; ele não poderia ficar isolado. O material não deveria envergonhar o estudante que o usar, então, um design mais moderno, mais sutil, deveria reduzir esse problema. E, por fim, a produção desse material teria que ser imediata, de baixo custo e descomplicada”, comenta o pesquisador.

Por meio da metodologia Design Science ou Ciência do Artificial, o cientista produziu – a partir de recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – quatro protótipos do BlindDS até à versão final. Logo após, realizou uma etapa de validação com estudantes deficientes visuais que estavam cursando graduações da área da Computação, e ainda com professores que ministram ou já ministraram a disciplina de Estrutura de Dados em instituições de ensino superior públicas ou particulares do estado do Ceará. Os retornos, que serviram como fundamento para ajustes e correções, foram bastante positivos. 

“A partir dos testes, recebi alguns feedbacks e identifiquei, nas observações, algumas melhorias. Fiquei imensamente feliz ao ver a reação de muitos deles, impressionados com a solução desenvolvida. Alguns ficaram bem empolgados para testar em um contexto real de sala de aula. O que resume os testes deles é a frase que ouvi de todos, que era mais ou menos assim: ‘Ah, se eu tivesse esse material na época que eu cursei Estrutura de Dados, teria sido muito diferente’”, relata o pesquisador. 

TECNOLOGIA LIVRE E INCLUSÃO 

Imagem: versão de teste sendo manuseada pelo inventor
O dispositivo foi validado por um grupo de estudantes da área de Computação e por professores de universidades do Ceará (Foto: Ribamar Neto/UFC)

Após a validação do produto, a etapa seguinte foi disponibilizá-lo para acesso livre. O modelo, junto às sequências didáticas e o guia de uso do material estão disponíveis na internet no projeto GitHub, uma plataforma de hospedagem de código-fonte e arquivos. “Qualquer pessoa ou instituição pode acessar. E um professor que vier a receber um aluno com deficiência visual na disciplina de Estrutura de Dados pode pegar os modelos do BlindDS e mandar imprimir em uma impressora 3D na própria instituição, ou em alguma empresa. Esses equipamentos estão com um custo mais acessível, a ideia está pública, junto ao modelo tridimensional para impressão, bem como outros pesquisadores podem se basear nesse material para desenvolver outras soluções”, afirma Allan Bezerra.

Pontua Allan que um dos principais objetivos do BlindDS é ser uma ferramenta contra a evasão dos estudantes com deficiência visual em cursos de graduação. “A desistência passa na cabeça de muitos alunos com deficiência visual, principalmente em cursos que usam muitos elementos visuais, gráficos, estruturas em desenho, tabelas ou organogramas. Espero que muitos desses alunos e os seus professores, em qualquer lugar do Brasil, possam encontrar o BlinDS e utilizá-lo, fazendo a diferença nos estudos de forma positiva”, conclui o desenvolvedor. 

Fonte: Allan George Bezerra, do Instituto UFC Virtual – e-mail: allangeorge@virtual.ufc.br

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Cristiane Pimentel 27 de agosto de 2025