Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, no Brasil, 116 milhões de pessoas estavam conectadas à Internet em 2016 e que mais de 63 milhões de brasileiros ainda mantinham-se off-line. Essas informações evidenciam que, embora o número de pessoas conectadas seja maior, ainda existe considerável exclusão digital de uma parcela da sociedade. Neste contexto, o projeto intitulado UFC e a Comunidade surge como iniciativa de democratização digital em Fortaleza.
Idealizada em 2016 pela Profª Cátia Silva, do Curso de Sistemas e Mídias Digitais, a iniciativa do Instituto UFC Virtual busca aproximar a comunidade do Planalto Pici das novas tecnologias e da Universidade. “Há dois anos, mudamos de bloco. O Curso de Sistemas e Mídias Digitais funcionava no anexo da Seara da Ciência. Ao nos mudarmos para o prédio novo, sentimos a necessidade de conhecer a comunidade que mora perto, no caso, o Planalto Pici”, explica Cátia Silva.
As atividades desenvolvidas no projeto são demandadas pela própria comunidade. A proposta inicial tinha os jovens como público-alvo. Entretanto, surgiu a demanda por um curso a partir de um grupo de mulheres artesãs chamado Brilho da Lua. As integrantes desse grupo sentiam a necessidade de utilizar o smartphone nos negócios, tanto para organizar melhor as anotações quanto para divulgar os produtos pelas mídias sociais. Atualmente, o perfil do público é de pessoas com faixa etária entre 40 e 70 anos de idade, geralmente mulheres, que utilizam a tecnologia com objetivos pessoais e profissionais.
“Elas enfrentam várias camadas de exclusão: social, econômica, digital e, também, de gênero. São mulheres com mais idade, que não têm a cultura do uso da tecnologia”, explica Cátia, acrescentando que, às vezes, elas são discriminadas dentro da própria casa, dificultando ainda mais a experiência com meios digitais. Segundo Cátia, o projeto sempre busca contextualizar o conteúdo ensinado com a realidade das participantes. Ensina-se, por exemplo, o que é uma planilha e quais as ferramentas disponíveis, mostrando casos do cotidiano que requerem o uso desse aplicativo.
Durante as aulas, as participantes relatam ocasiões em que precisaram usar a tecnologia. Meiry Vieira é funcionária terceirizada da UFC e beneficiária do projeto. Ela conta que soube da iniciativa por um colega da Universidade. “Sou porteira e agora utilizamos planilhas no trabalho. Então, quando surgiu a oportunidade da oficina de planilhas, meu colega, Seu Valdizio, me convidou para participarmos juntos”, relata.
TUTORIA
As aulas do projeto seguem uma metodologia de facilitamento da aprendizagem. Fugindo do modelo de aula expositiva, o curso utiliza um sistema de tutoria, no qual cada participante é acompanhada por um tutor, que, geralmente, é um aluno do Curso de Sistemas e Mídias Digitais.
Apesar do caráter mais orientado à vida profissional, o UFC e a Comunidade também possibilita conhecimentos sobre o uso pessoal do smartphone. Maria do Livramento, por exemplo, explica que aprendeu a usar a galeria de fotos e que, atualmente, já consegue utilizar aplicativos como Whatsapp e Instagram. Ela diz querer aprender ainda mais. “A gente tem a cabeça ruim e, às vezes, os filhos não ensinam, mas aprendi algumas coisas. Consigo apagar fotos da galeria e agora quero aprender a postar”, diz.
A estudante Suzy Costa, bolsista do projeto, é uma das tutoras das ações. Ela também produz material de ensino e ministra oficinas. Para Suzy, a prática da extensão possibilitou maior percepção sobre o retorno das atividades desenvolvidas, no sentido da sua contribuição profissional na vida das pessoas. “Ao trabalhar com esse novo público, tive que mudar o ritmo e aderir a uma nova metodologia. Além de falar sobre as ferramentas da oficina, temos conversas. Às vezes, não é uma só uma questão técnica, e sim o fato de as pessoas se sentirem acolhidas”, argumenta.
Além disso, outro ponto destacado pela bolsista é o feedback que as participantes dão após o curso. “Certa vez, uma delas mandou um áudio no grupo do Whatsapp para agradecer por ter aprendido a usar o alarme, possibilitando que pudesse acordar cedo e ir caminhar. Ela contou que era algo que há muito tempo queria aprender”, conta a estudante.
Além das ações, são desenvolvidas pesquisas relacionadas às atividades. A estudante Vitória Facundo explica que trabalhos feitos a partir do projeto já foram submetidos a alguns eventos acadêmicos, como o Congresso Internacional em Humanidades Digitais, que ocorreu em 2018 no Rio de Janeiro.. “O contato com essa iniciativa dentro da rotina acadêmica me fez compreender a possibilidade do projeto como política pública”, completa.
VIA DE MÃO DUPLA
A coordenadora Cátia Silva considera que a iniciativa traz ganhos a cursistas e tutores. A professora diz que entende a ação como aproximação da Universidade com a comunidade. “Esse projeto de extensão é um retorno que a UFC, como universidade pública e gratuita, dá à comunidade do Planalto Pici. É também uma via de mão dupla, pois melhora não só os conhecimentos dos cursistas da comunidade, mas também dos próprios alunos e alunas da UFC que participam. Acima de tudo, é uma oportunidade de convivência saudável entre todos.”
O projeto funciona seguindo o calendário da Universidade. O Grupo de Mulheres do Brilho da Lua capta participantes da comunidade do Pici para participar das oficinas. As inscrições são abertas aos moradores da comunidade. As oficinas são realizadas aos sábados, das 8h às 12h, no Instituto UFC Virtual, no Campus do Pici Prof. Prisco Bezerra. A partir de conversas com a comunidade, são decididas temáticas para o semestre.
Ely Eulle Viana, sob supervisão de Narjara Pires