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Qual é a origem genética dos povos do semiárido?

Pesquisa da UFC revela, com dados surpreendentes, que há ascendência asiática na população do semiárido nordestino

A diversidade genética brasileira é perceptível até pelo olhar e sempre foi de conhecimento comum que somos formados por uma mistura de diferentes povos. Mas, para entender nossa origem de forma mais específica, pesquisadores da Universidade Federal do Ceará decidiram investigar as marcas genéticas presentes na população do semiárido nordestino do Brasil. A pesquisa trouxe resultados inesperados.

O DNA coletado para o estudo revelou 56,8% de origem europeia (portuguesa e holandesa), número superior ao que se normalmente imaginava, e 22,9% de origem africana (principalmente do Quênia). A maior surpresa, porém, foi a detecção de 20,3% de origem ameríndia, com ascendência de povos asiáticos originários de Bangladesh, na região de Bengala.

Para chegar a esses números, foi coletada a saliva de 1.538 crianças de até 36 meses de idade em cidades interioranas do Nordeste. Foram incluídas as cidades de Crato (CE), Picos (PI), Ouricuri (PE), Cajazeiras, Sousa e Patos (PB).

Esses dados ajudam a confirmar a teoria de que os primeiros indígenas americanos vieram de uma migração da Ásia, instalando-se inclusive no Nordeste brasileiro. Há muitos debates sobre como esse processo se deu, mas sabe-se que eles utilizaram uma “ponte de gelo” onde atualmente existe o estreito de Bering, entre a Ásia e o Alasca. Isso também ajuda a explicar a fisionomia desses povos indígenas, com olhos levemente puxados e pele parda.

PESQUISA

Realizada em parceria com a Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, a pesquisa surgiu como desdobramento de um estudo sobre a influência da genética nos casos de diarreia no Nordeste. O DNA coletado por meio da saliva de crianças que participaram desse estudo serviu como material de análise para a identificação de biomarcadores que ajudaram a revelar a origem dos nossos povos.

O Prof. Aldo Ângelo Moreira Lima, coordenador do Laboratório de Doenças Infecciosas da Faculdade de Medicina e um dos responsáveis pela pesquisa, explica que os dados foram examinados a partir de cerca de 400 mil biomarcadores genéticos que apontam as ascendências europeia, africana e asiática. “Com isso na mão, há um grau de certeza muito alto, acima de 95%”, avalia.

DNA

As conclusões da pesquisa foram feitas por meio da análise do chamado polimorfismo de um único nucleotídeo. Trata-se da variação na sequência de DNA que afeta apenas uma base do genoma (composta por adenina, timina, citosina e guanina). Com isso, é possível fazer uma análise comparativa com informações de outras populações.

Esse processo guarda certo nível de similaridade com o que é feito nos testes de paternidade, explica o Prof. Alexandre Havt, também ligado à pesquisa. “É feita uma análise estatística baseada em bancos de dados de outras populações espalhadas pelo mundo. Quanto mais polimorfismos semelhantes encontramos, mais uma pessoa é similar a outra”, diz.

Para o pesquisador, a importância do estudo não está só na análise do material genético indígena, dado até então desconhecido, mas também na confirmação da origem múltipla brasileira. “As pessoas precisam ter noção de qual é a origem delas e saber que o Brasil inteiro é uma miscigenação completa. Nós não somos uma coisa só, nunca fomos”, diz.

SERVIÇO

Acesse a íntegra da pesquisa (em inglês).

Kevin Alencar 13 de março de 2018

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