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Estudo identifica fatores associados a acidentes de trânsito com vítima em Fortaleza

Pesquisa da UFC analisou de forma inédita os dados do trânsito de Fortaleza em intervalos de 15 minutos para entender os fatores envolvidos nas ocorrências com vítima

Estudo realizado no Programa de Mestrado em Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará mapeou as principais variáveis dos acidentes de trânsito com vítimas em Fortaleza. Para isso, o pesquisador Lucas Tito Pereira Sobreira e seu orientador, Prof. Flávio Cunto, analisaram registros de acidentes de trânsito entre 2015 e 2017 e compararam-nos com o banco de dados do sistema SCOOT, da Prefeitura de Fortaleza.

O SCOOT é um sistema utilizado para detectar congestionamento e otimizar o ciclo dos semáforos. Ele é formado por uma rede de sensores próximos aos sinais e se concentra principalmente nos bairros da Aldeota e Meireles. Por ele, os pesquisadores conseguem saber o volume de veículos que circula na cidade em cada ponto monitorado. Os dados foram separados em intervalos de 15 minutos, de modo que foi possível mapear qual era o cenário do momento em que cada sinistro ocorreu.

Uma das principais contribuições do trabalho foi identificar as condições de tráfego em que os acidentes ocorrem com maior frequência: quando há grande demanda veicular em uma via com semáforos com “ciclo curto” (que abrem e fecham de forma rápida); mas também quando há baixa demanda com semáforos que demoram a fechar.

De acordo com o mais recente Anuário de Segurança Viário de Fortaleza, o número total de acidentes na cidade vem caindo desde 2016, chegando a 14.525 em 2019, dado mais recente. O número de mortes no trânsito também vem decaindo, passando a 191 naquele ano. Ainda assim, os chamados acidentes de transportes terrestres são a 16ª causa de mortes na cidade.

Veja, ano a ano, a quantidade de acidentes em Fortaleza, de acordo com o Anuário da Segurança Viária
Gráfico de linha mostra a queda do número de vítimas de acidentes fatais em Fortaleza entre 2012 e 2019, de acordo com o Anuário da Segurança Viária

O risco de morte no trânsito varia de acordo com gênero e idade. Ainda segundo o anuário, o risco relativo para homens com mais de 60 anos é cinco vezes maior do que para o restante da população. As mortes ocorrem principalmente entre pedestres. Já para o caso do risco de acidentes com vítimas não fatais, o risco é maior para homens entre 18 e 59 anos, com perfil de motociclistas e passageiros de motocicletas.

FUGINDO DA MÉDIA

A relação entre acidentes com vítimas, volume de tráfego e ciclo dos semáforos só foi possível graças à nova abordagem adotada pelo pesquisador. Tradicionalmente, as pesquisas em segurança de trânsito utilizavam dados agregados para analisar os cenários de acidente em determinadas regiões.

“Quando se está trabalhando com agregação diária, pega-se uma média daquelas condições e analisam-se todos os acidentes que ocorreram naquele local por essa média. Com isso, a gente acaba perdendo muita informação”, diz o pesquisador Lucas Tito Sobreira.

Para fugir da média, a ideia é “desagregar os dados”, ou seja, analisá-los em intervalos pequenos de tempo. Dessa forma, é possível entender de forma mais precisa as condições que antecedem cada sinistro. As pesquisas mais atuais na área de segurança do trânsito têm utilizado essa metodologia, observando principalmente as condições de tráfego em rodovias. O caráter inovador do estudo é focar em uma área urbana com grande quantidade de semáforos, como em Fortaleza.

Para chegar aos resultados, Lucas cruzou o banco de dados dos sinistros de trânsito de Fortaleza com os do SCOOT. Primeiro, avaliou o caso dos acidentes que envolvem apenas danos materiais, sem vítimas. “A gente viu que esses acidentes são mais frequentes em regimes que têm trânsito mais carregado, que têm maior volume [de veículos] e velocidade menor. Mas isso já era esperado”, diz o pesquisador.

O segundo passo foi analisar os sinistros com vítimas, sejam elas fatais ou não. E aqui, a primeira surpresa: a frequência de acidentes em situações com trânsito congestionado e trânsito livre não era muito diferente.

“Percebemos que uma parcela dos casos provavelmente se deu por conta da vulnerabilidade dos usuários, como motociclistas, ciclistas e pedestres. Outra parcela dos casos ocorreu em vias mais livres, certamente relacionada ao desempenho de velocidades mais altas”, diz Lucas.

Trânsito na Avenida da Universidade, em Fortaleza (Foto: Viktor Braga/UFC)

O estudo começou a aplicar algumas variáveis sobre esses dados, como o número de faixas e a quantidade de interações. Com isso, identificou uma variável crítica: a duração do ciclo semafórico.

“Imagine: muita gente querendo atravessar o semáforo, e ele com ciclo bem curto. Isso vai aumentar as interações traseiras e transversais (ou seja, a possibilidade tanto da batidas de um veículo na traseira de outro, como no cruzamento) e a exposição de condutores, pedestres e ciclistas ao risco”, analisa o pesquisador.

A segunda condição foi a de cenários com baixo volume de tráfego e o tempo de sinal demorado. “Vem uma interpretação oposta: o motorista está no semáforo, e o ciclo está longo. Ele vê que não está passando ninguém e, provavelmente, fica mais propenso a furar o semáforo, o que pode provocar colisões ou atropelamentos na sequência”.

Outro cenário possível, com a mesma condição: ciclos mais longos podem estar relacionados ao desenvolvimento de velocidades mais altas (como no caso de uma sequência de semáforos abertos, as “ondas verdes”), o que também aumenta o risco. Outro cenário possível, com a mesma condição: ciclos mais longos podem estar relacionados ao desenvolvimento de velocidades mais altas (como no caso de uma sequência de semáforos abertos, as “ondas verdes”), o que também aumenta o risco.

DESDOBRAMENTOS

Os achados da pesquisa podem vir a gerar desdobramentos práticos. “Se conseguirmos identificar o ciclo veicular em tempo real, poderemos alterar o ciclo dos semáforos automaticamente e, com isso, reduzir a probabilidade de um sinistro ocorrer”, diz o pesquisador Lucas Tito Sobreira.

Atualmente, Fortaleza possui 1.032 semáforos e uma Central de Tráfego de Área (CTAFOR), além de 110 câmaras de videomonitoramento – o sistema SCOOT abarca apenas parte dessa rede de semáforos e nem sempre apresenta informações contínuas.

O estudo foi publicado recentemente no Journal of Safety Research, com fator de impacto de 4,261. A dissertação resultou ainda em outro artigo publicado, dessa vez na Revista Transportes. O pesquisador Lucas Tito Sobreira atualmente faz doutorado na Universidade de Waterloo, no Canadá.

Fonte: Pesquisador Lucas Tito Pereira Sobreira – e-mail: lucastito@det.ufc.br / lsobreir@uwaterloo.ca

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Erick Guimarães 5 de outubro de 2021

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