A maioria dos medicamentos fabricados pela indústria farmacêutica é de origem sintética, ou seja, produzida em laboratórios. No processo de fabricação são utilizados catalisadores, substâncias aceleradoras da reação dos compostos que darão origem ao fármaco e ajudam a direcionar a formação da estrutura química do medicamento desejado.
Pesquisadores do Laboratório de Biotecnologia e Síntese Orgânica (Labs), do Departamento de Química Orgânica e Inorgânica, têm trabalhado para tornar esse processo de fabricação mais sustentável, na perspectiva da chamada química verde.
Coordenado pelos professores Marcos Carlos de Mattos, Maria da Conceição Oliveira, Davila Zampieri e Fátima Nunes, o grupo transforma o processo de produção de medicamentos já existentes substituindo catalisadores químicos por biocatalisadores (enzimas). A ideia é criar um novo processo para o mesmo produto final, diminuindo o impacto ambiental da indústria farmacêutica e reduzindo custos da produção de alguns fármacos.
PROBLEMA AMBIENTAL
Em escala industrial, os catalisadores químicos utilizados na produção de medicamentos acabam se tornando um dejeto prejudicial ao meio ambiente.
No Labs, um dos biocatalisadores mais utilizados para resolver esse problema é a lipase. Trata-se de uma substância biodegradável que se tem mostrado eficiente para realizar a catálise das reações estudadas até então, reduzindo o custo das produções em até 50%.
Para tanto, os pesquisadores partem da síntese quimioenzimática – técnica que utiliza enzimas em reações químicas para reduzir o número de etapas na produção de medicamentos – para elaborar fármacos já conhecidos de forma mais eficiente. Isso porque uma das preocupações centrais do laboratório da UFC é desenvolver processos de produção que tenham vantagem em relação aos já estabelecidos.
Essa é uma preocupação nova para o Brasil, ainda muito dependente da importação de fármacos (cerca de 90% dos produtos comercializados advêm do exterior).
“É uma síntese química tradicional, mas com biocatálise. Usamos catalisadores biodegradáveis fazendo uma rota sintética mais limpa”, explica o Prof. Marcos Carlos de Mattos, que, ao lado da Profª Maria da Conceição, coordena a pesquisa. “É uma inovação tecnológica porque reduzimos o número de etapas reacionais, a quantidade de rejeitos e usamos reagentes menos tóxicos e mais baratos”, diz Mattos.
Dentre os medicamentos já sintetizados pelo laboratório com esse método estão o mesilato de rasagilina (usado no primeiro estágio contra o mal de Parkinson), os ésteres do antibiótico tianfenicol, a dapoxetina (utilizada contra a ejaculação precoce), o betabloqueador (S)-pindolol (antiarrítmico e anti-hipertensivo), o luliconazol (antifúngico), uma naftoquinona (usada na terapia contra o câncer) e a (R)-clorprenalina (utilizada para asma e bronquite).
ENZIMA
Uma vantagem da lipase é que se trata de uma enzima comercial de fácil aquisição. Nos seres vivos, ela possui a função de “quebrar” gordura. Outro fator positivo é que ela não depende de outras substâncias para realizar sua atividade, apresentando ainda a capacidade de agir em uma gama muito grande de substratos, razão da variedade de compostos estudados no Labs.
Além de diminuir o tempo e os custos do processo de produção de fármacos, a enzima também tem grande potencial de reutilização. Quando imobilizada e ligada a um suporte (como um polímero ou uma resina), é possível filtrar a lipase e usá-la para uma nova produção. “Já conseguimos reutilizá-la 10 vezes em um processo, o que a torna economicamente viável”, conta o Prof. Marcos.
Os pesquisadores explicam que a biocatálise já é uma realidade em alguns procedimentos da indústria, dadas as vantagens apresentadas. O trabalho realizado pelo laboratório, porém, se volta a produtos ainda apoiados no método tradicional. “Chegamos ao mesmo composto, mas com um processo diferente, alternativo e verde”, explica a Profª Maria da Conceição.
Fonte: Prof. Marcos Carlos de Mattos, do Labs – e-mail: mcdmatto@ufc.br