Agência UFC

Saúde

Como sua mente tem impacto no crescimento do câncer

Laboratório da UFC confirma, em modelo animal, que tumores podem crescer mais rápido em pacientes depressivos

Doenças psiquiátricas podem ter relação direta com o modo como o câncer se desenvolve, inclusive influenciando no crescimento dos tumores. Pesquisa desenvolvida pelo Laboratório de Neuropsicofarmacologia e Psiquiatria Translacional e pelo Laboratório de Oncologia Experimental (LOE), ambos do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos (NPDM) da Universidade Federal do Ceará, avaliou o nível de crescimento de tumores em animais que apresentam sintomas típicos da depressão.

Nos animais com comportamento depressivo, o crescimento constatado do tumor chegou a ser três vezes maior, em um mesmo período de tempo, em comparação ao crescimento em animais saudáveis.

As causas biológicas para tanto ainda estão sendo avaliadas, mas os pesquisadores trabalham com a possibilidade de o elo entre as duas doenças se dar no processo relacionado ao metabolismo da serotonina, neurotransmissor responsável por fatores como indução de bem-estar, redução de ansiedade e ativação da memória. A queda no nível de serotonina está relacionada à manifestação de comportamento depressivo, agressivo ou ansioso.

Frascos de laboratório em primeiro plano e um rapaz com jaleco segurando uma pipeta em segundo plano (Foto: Jr. Panela/UFC)

As pesquisas são feitas pelo Laboratório de Neuropsicofarmacologia e Psiquiatria Translacional e pelo Laboratório de Oncologia Experimental (Foto: Jr. Panela/UFC)

Na via de metabolização da serotonina, também estão presentes substâncias que induzem estresse oxidativo (desequilíbrio entre a formação e a eliminação de agentes oxidantes no organismo) de células e influenciam o padrão de crescimento do tumor. Além disso, essa via é relacionada a alterações na imunidade.

“O próximo passo é entender como esse processo altera o cérebro do animal deprimido e como isso repercute na imunidade dele e, por conseguinte, na evolução do câncer”, explica a Profª Danielle Macedo , orientadora da pesquisa.

TRAUMA, UMA PORTA PARA A DOENÇA

Para realizar o estudo, os pesquisadores desenvolveram um modelo indutor da depressão em camundongos ainda em fase inicial de vida. Durante 13 dias, por uma hora diária, o recém-nascido foi separado da mãe.

A opção pela separação como forma de induzir a depressão foi em razão da durabilidade das consequências psicológicas que um trauma no início de vida pode gerar. “Queríamos entender como um evento precoce na vida é capaz de deflagrar alterações comportamentais a longo prazo e que impacto isso tem para a saúde mental e sistêmica da pessoa afetada”, explica Danielle.

Pesquisadora Danielle Macedo em primeiro plano, sentada em sua mesa e sorrindo (Foto: Jr. Panela/UFC)

A orientadora da pesquisa, Profª Danielle Macedo, segue a hipótese de que a relação entre câncer e depressão se dá pela metabolização da serotonina (Foto: Jr. Panela/UFC)

Para constatar que o camundongo adulto está realmente deprimido, é feito um teste chamado “suspensão de cauda”, cujo objetivo é provocar uma reação no animal. “Quando um ser está deprimido, ele se entrega. Não tem mecanismo de defesa para sair de uma situação estressante e difícil”, explica.

A partir disso, é feita a inoculação de células de melanoma (câncer de pele) nos animais depressivos e em animais sadios. O tempo total, desde a inserção das células até a avaliação final do crescimento tumoral, foi 25 dias.

Com o avanço da pesquisa e da comprovação da influência da serotonina nesse processo, tratamentos futuros voltados simultaneamente ao câncer e à depressão podem ser viáveis

A relação entre as doenças psicológicas e o câncer já foi objeto de outros estudos na literatura médica, sobretudo no que se refere à resposta às tentativas de cura da neoplasia. O ineditismo da pesquisa consiste em associar a evolução do tumor a uma depressão provocada por trauma.

Ainda que a primeira célula modificada não tenha surgido por conta de um evento traumático, a pessoa que já possui tendência ao câncer pode ter imunidade reduzida e, portanto, encontrar no evento o estopim para o desenvolvimento da doença.

VANTAGENS

Para a Profª Danielle, doenças psiquiátricas como a depressão, em face do câncer, são vistas como secundárias, com tratamento visando muito mais ao controle do crescimento do tumor do que à saúde mental do paciente. Com o avanço da pesquisa e a comprovação da influência da serotonina nesse processo, tratamentos futuros voltados simultaneamente às duas doenças podem ser viáveis. Até mesmo estratégias de prevenção devem ser pensadas a partir do estudo, por meio do fortalecimento do sistema imunológico após um trauma ou o início de um comportamento depressivo.

Fonte: Profª Danielle Macedo, do Laboratório de Neuropsicofarmacologia e Psiquiatria Translacional – e-mail: daniellesilmacedo@gmail.com

Kevin Alencar 30 de agosto de 2017

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